Sou um privilegiado. Não nasci, nem cresci no Conjunto Virgem dos Pobres. Mas, mesmo tendo surgido para o mundo em outra área, me incomodo com a condição de quem mora lá. Será que sou louco?
Na verdade não! Me incomodo porque sei que parte dos que lá estão, adultos ou crianças, poderão ser notícia ou alvo de alguma pauta que venha a fazer. Quando escolhi ser jornalista queria falar da vida. Ou dos problemas dela.
Mas, em Alagoas, só se fala em morte. No palco da vida, é ela que está sempre como protagonista. Na semana passada, a Oranização das Nações Unidas (ONU), nos colocou em primeiro lugar, mais uma vez como estado mais violento do país.
E não é difícil saber porque. Os sites, agências de notícias e jornais, em geral, estampam a todo momento um corpo no chão. Até aí, nada de novo.
O fato, porém, é que além do morto, normalmente há uma plateia sendo formada para o terror. Sem nunca terem ido, ou com chances de irem ao teatro, o palco que conhecem é a rua. Nela, encontram sangue de verdade e um corpo de verdade. Não é maquiagem.
A vida e nada, neste locais é a mesma coisa. Nesta foto está o exemplo. Crianças apreciam, ao lado dos pais, ou melhor, na maioria só com as mães, mas uma tragédia anunciada.
O corpo, o sangue, a tragédia não incomodam mais. Fazem parte da rotina. Até a bola, a brincadeira de rua e correria tão peculiar entre qualquer criança, ficam de lado.
Foto: Railton Teixeira - Alagoas 24 Horas
É "a vida como ela é", como dizia a coluna de Nelson Rodrigues, na década de 70. Mas, nem ele seria capaz que chegaríamos a isso. Digo a esse desprezo pela vida. Não há mais lágrimas. Ou quase sempre não. Apenas os parentes choram. Quando choram!
Agora, pergunto: será que alguém que cresce sem temer a morte, se acostumando com ela em todos os seus lances crueis, vai temer morrer ou matar?
Creio que não! Minha tese é que nós, que crescemos sonhando com a vida, lendo e brincando com histórias felizes, fomos educados para valorizá-la.
Acho que precisamos agir. Não sei bem como. Não tenho fórmulas. Mas defendo que nos mexamos, nos reunamos, conversemos para buscarmos alternativas que possamos apresentar para as crianças destes locais.
Penso que se crescerem só convivendo com isso, não hesitarão, mais tarde em tirar nossas vidas. Isso, em qualquer circunstância.
Precisamos nos sentir responsáveis, também, além de Estado e Município, quanto a esta crise de identidade. Porque, do jeito que vai no palco da vida só terá tragédia em cartaz.
Um comentário:
O assunto é sério e sua abordagem foi boa, amigo. Essas crianças, acostumadas a olhar a morte de perto e aprender a encarar a vida com desdém até, logo serão adultos. Semana passada, no ônibus, vi um guri crescido que, há três anos atrás, quando eu chegava a Maceió, já ocupava aquele mesmo lugar: o de pedinte no coletivo, com uma história trágica para contar. Hoje ele é um adolescente, as pessoas não se sensibilizam tanto. Que meios ele pode usar para tirar o seu sustento daqui a pouco? Espero que não os mais trágicos.
Postar um comentário